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domingo, 19 de fevereiro de 2012

Câmera? Que Câmera?


Aproveitando o ensejo da matéria anterior, acho oportuno tratar de um assunto essencial e no entanto pouquíssimo considerado nos dias de hoje em relação a videogames, que é a câmera. Sendo que tal coisa nem existe em jogos pra começo de conversa.


Apesar de dividir o nome com o aparelho cinematográfico, de pouco a nada divide com ele. A começar pela ausência de fisicalidade (tradução: ela não existe). Sendo a definição da câmera como um aparelho que capta luz refletida do ambiente e dos objetos contidos nele para futura impressão ou rehttp://www.blogger.com/img/blank.gifprodução animada, é natural de se imaginar porque essa definição não se deve levada a sério em relação a jogos. Afinal, que luz há no jogo em si para ser “captada” e “reproduzida”? Não se engane, a luz gerada é do aparelho visual que revela o jogo já na sua completude, seja esse a televisão, o monitor ou a telinha do celular, tablet, etc. Sem esse intermediário, ficaríamos relegados a jogos de texto e de áudio.

Há um elemento de busca nessa definição atual, muito voltada para o respaldo do cinema como forma de arte já há mais tempo legitimizada e exemplo de fórmula comprovada de lucro e aclamação. Vide os blockbusters e as iscas de Oscar. Esse tipo de respaldo é claramente perseguido nos jogos das últimas duas décadas, com o aumento da tecnologia permitindo mais desenvolvimento e armazenamento de cenas cada vez mais extensas e complexas que no entanto possuem tramas bastante simplistas em essência e no entanto desnecessariamente complicadas no seu desenrolar.

O empréstimo de técnicas cinematográficas realistas em videogames é muito válido já que ambos compartilham da importância que o elemento visual possui em seus âmagos, mas é muito reducionista considerar que esse é o único ou sequer o melhor caminho para se fazer jogos em detrimento de todos os outros.

Gráficos vetoriais em jogos são um bom exemplo. Sem pretensões de reproduzir o real com pixels complexos, jogos vetoriais davam ênfase às formas e cores brutas, sem no entanto deixar de lado a beleza estética que enriquecia a experiência do jogador, com exemplos primorosos como Out of This World e Flashback, o primeiro desenvolvido por Eric Chahi em 1991 e o segundo em 1992 por Paul Cuisset, ambos publicados pelo estúdio francês Delphine Software e lançados original para o computador Amiga. O legado de Out of This World (originalmente chamado Another World na Europa) é reconhecido por designers consagrados na atualidade como Fumito Ueda (Ico, Shadow of The Colossus), Goichi Suda (Killer7, No More Heroes), Shu Takumi (Ace Attorney) e Hideo Kojima (Metal Gear Solid).

SimCity, criado em 1989 pelo americano Will Wright, denota inventividade puro acaso se combinando para gerar uma lendária série com influências muito além de seus tempos de origem. O embrião desse jogo surgiu na verdade no jogo chamado Raid on Bungeling Bay lançado para o computador Commodore 64 em 1984, cujo editor de terrenos usado por Wright para construir as fases se mostrou tão prazeroso de usar que ele simplesmente decidiu investir futuramente em um jogo que consistisse justamente de construir terrenos e estruturas complexas. Vestígios do que viria a ser SimCity já eram visíveis na complexidade revolucionária com a qual as estruturas em Raid on Bungeling Bay se desenvolviam automaticamente, como fábricas que se desenvolviam e expandiam no decorrer do tempo caso o jogador não as bombardeasse há tempo com seu avião.

O ponto de vista vindo de cima foi muito importante para facilitar a jogabilidade de ambos e deve-se notar que ele não é nada realista, pois carece da distorção natural que percebemos no terreno abaixo quanto mais nos elevamos, pois vivemos num planeta curvo. Esse de distorção completamente realista trapalharia imensamente em um jogo como SimCity onde uma visão bastante geral do terreno que se admnistra é essnecila para um jogo satisfatório. O realismo foi sabiamente ignorado na questão visual e mais sabiamente ainda direcionado para a questão do planejamento urbano, processo técnico e político que Wright fez questão de pesquisar para que o jogo tivesse uma riqueza de detalhes e desafios. O esforço compensou em dobro, levando em conta os inúmeros prêmios, continuações e clones que gerou nos anos que sucederam ao jogo original.

Uma técnica que nada deve ao realismo é conhecida como Wraparound (algo como “envolve em torno”). Exemplos lendários como Asteroids e Pac-Man ilustram essa técnica francamente surreal onde o protagonista atravessa o limite da tela para ressurgir no lado diametralmente oposto. Baiscamente esse recurso denota o chamado espaço não-euclidiano, ou seja, um espaço que perverte as regras básicas da geometria que conhecemos e com a qual convivemos no dia-a-dia. O potencial de exploração numa técnica dessa natureza é imenso, no sentido de perverter e desafiar o senso de direção e localidade dos jogadores. Raros exemplos atuais levam esse potencial adiante, como o genial jogo Portal, desenvolvido pela americanava Valve em 2007.







Uma técnica a ser respeitada por quebrar com a até então prevalente regra de “apenas uma tela por fase” é a chamada Flip-screen (“mudar tela”, aproximadamente). Um dos primeiros exemplos registrado de seu uso acontece já em 1981 com o jogo Space Dungeon, desenvolvido pela japonesa Taito. Mas os jogos que mais necessitavam de seu uso pertenciam ao computador ZX Spectrum, devido a uma limitação técnica dele que impedia uma reprodução de cores consistente enquanto a tela se deslizava constantemente (scrolling) fez com que a técnica do flip-screen se tornasse a favorita para jogos coloridos nesta plataforma, em jogos como Jet Set Willy e Starquake, respectivamente de 1984 e 85. O exemplo mais famoso provavelmente é o jogo The Legend of Zelda, desenvolvido por gênio Shigeru Miyamoto e Takashi Tezuka em 1986 e lançado para a saudosa plataforma NES.

Outra técnica visual extremamente difundida e explorada é do side-scrolling (“rolagem lateral”), que na verdade já existia anterior ao flip-screen, apesar de parecer ser sua sucessora. Sega lançou em 1977 um jogo chamado Bomber, onde você pilota um bombardeiro por um cenário que possui um plano de fundo repleto de prédios que deslizam pela tela. Como quase sempre acontece, os exemplos mais famosos não são normalmente os originais. Esse também foi o caso, pois o primeiro clássico a popularizar o side-scrolling foi Defender, publicado pela companhia Williams Electronics em 1980. O impacto dessa então nova técnica foi imenso, porque permitiu que o ambiente do jogo se extendesse além dos limites da tela. O ótimo Rally-X, o jogo de corrida do mesmo ano lançado pela japonesa Namco também ajudou nesta popularização, junto com o advento do mini-mapa.

Mais uma é a projeção isométrica, também conhecida como “perspectiva 3/4”, cujo pioneiro no seu uso foi o jogo de arcade Zaxxon, produzido pela Sega em 1982. Um exemplo clássico dessa implementação é o jogo Q*bert, desenvolvido no mesmo ano pela corporação americana Gottlieb, cujo objetivo é fazer com que o personagem de memso nome pise e assim modifuqe a cor de todas as plataformas dispostas de maneira angulada na tela para passar de fase. Jogos relativamente mais recentes, como os clássicos Diablo (1996 - Blizzard) e Fallout (1997 - Interplay) fizeram grande uso desse tipo de visualização pra maximizar a imersão tática e interativa do jogador.





Deixando o melhor por último, vou comentar do efeito parallax (parallax scrolling). No momento que comecei a escrever esse parágrafo, me toquei de que esse é um dos efeitos de visuais dos videogames antigos que mais depende da abstração da suposta câmera, pois ele consiste em mover mais lentamente as imagens de fundo enquanto mais rapidamente move as imagens da frente, ou seja, difere as velocidades de deslizamento entre as imagens “mais distantes” e as “mais próximas” da “câmera”.

Enfim, esse efeito foi influenciado diretamente pela câmera multiplano, que permitiu usar o efeito parallax em animações como Branca de Neve e Os Sete Anões (Disney – 1937). Seu uso em jogos foi uma grande idéia, pois causa no jogador grande imersão com a ilusão de que está encarando um cenário com produndidade na terceira dimensão. O primeiro jogo conhecido a emprestar essa técnica cinematográfica foi Moon Patrol, produzido pela japonesa Irem para arcades em 1982. Nele, você controla um jipe que patrulha a lua defendo-a de invasores em um cenário com efetivo parallax sendo gerado pela diferença de movimento entre o plano principal e dois planos de fundo. Este é apenas um de quatro diferentes métodos de parallax:

Moon Patrol usa o método de camadas, onde cada plano é contido em uma camada exclusiva o que permite movimentos independentes, apenas sendo combinados visualmente para finalizar o efeito. Um exemplo moderno desse método é o do jogo The Whispered World, produzido pelo estúdio alemão Daedalic Entertainment em 2009.

O médoto de sprite consiste no hardware gerar os ditos cujos (objetos individualmente controláveis gerados na tela) à frente ou por trás do plano ou camada visual principal, quando disponível no sistema que está processando o jogo. O jogo Star Force (1984 – Tehkan [futura Tecmo]) para o usou está técnica para as estrelas que deslizam pela tela.

O método de padrão repetido se utilizada de “telhas” individuais que flutuam sobre um plano de fundo repetitivo animando os bitmaps de cada uma, causando a ilusão de outro plano. Este efeito é usado com grande sucesso no jogo adequadamente chamado Parallax, desenvolido em 1986 pela britânica Sensible Software para o computador Commodore 64.

E pra encerrar, o método raster. Esse termo se refere a gráficos gerados por uma grade normalmente retângulas de pixels, os sempre úteis pontos de cor (na verdade retângulos/quadrados) que são os menores elementos visuais em tvs e monitores que forma TODAS as imagens que vemos neles. Ao animar sses gráficos, eles normalmente são atualizadas na tela linha por linha de cima pra baixo com um pequeno atraso (chamado de “intervalo de apagamento horizontal”) entre o desenho de uma linha e a próxima. Jogos feitos para chipsets se aproveitaram genialmente desse atraso para criar ilusões de várias camadas. Isso foi especialmente útil em sistemas de 8-bit como o NES, onde jogos como Ninja Gaiden III e Vice: Project Doom puderam aproveitar ao máximo da beleza e ilusão que o efeito parallax pode gerar na mente dos jogadores.

Com foi ilustrado na técnica do parallax, técnicas oriundas da câmera real tem sim muito a oferece para o enriquecimento dos videogames mas a ênfase na pura representação realista e cinematográfica deixa de ser uma exploração interessante de efeitos emprestado de outras artes para se tornar um fi m em si mesmo e um padrão a ser cultuado (culto girando em torno da câmera, que ironicamente nem sequer existe de fato em videogames), algo que vai contra a própria definição da inovação.

Considero crucial que esta seja sim considerada uma fonte rica e válida para jogos, mas nunca a única, pois o mundo da animação, teatro, pintura e tantos outros podem beneficiar muito a criatividade implementada nos jogos. Expandir os limites ao invés de restringí-los é fundamental.

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